2 de dezembro de 2010

Cablegate. Open Government e Internet x Liberdade - Parte I

Na semana passada, o WikiLeaks anunciou que iria iniciar a divulgação de mais de 250.000 cables - 'telegramas' enviados entre diplomatas americanos pelo mundo e o Departamente do Estado dos EUA - entre 1966 e Janeiro de 2010, dos quais 100.000 são confidenciais e 15.000 são classificados como secretos.

Segundo o mesmo site, essa divulgação seria "the largest set of confidential documents ever to be released into the public domain", e, independentemente das opiniões sobre a legitimidade e prudência de tal divulgação, é inegável que este está sendo, certamente, um dos fatos mais impactantes para a política externa americana no segundo semestre.

Nesta primeira parte, vou abordar parte dos conteúdos vazados até agora, e em linhas gerais quais são os possíveis prejuízos dos EUA em política externa, e o que isso pode nos dizer sobre a postura dos EUA em relação a outros líderes e países.

Os cables (clique nos links para ver exemplos) trazem importantes revelações sobre os bastidores da Política Externa Americana, deflagrando por exemplo diversas opiniões de líderes internacionais, o entrelaçamento entre a diplomacia e a inteligência, além das preocupações e opiniões americanas sobre o resto do mundo (incluindo o caráter dos líderes) e sobre relações governos-empresas e empresas-empresas.

Para uma maior noção do caráter dos dados que foram publicados, segue um pequeno resumo do que saiu:

> As principais fontes dos cables, ordenadas por número de mensagens enviadas: Secretaria de Estado, Ankara, Bagdá, Tóquio, Amã, Paris, Kuwait, Madrid, Taiwan e Moscou.

> A Embaixada Americana em Brasília é somente a 41ª fonte na lista de envios.

> O país mais discutido foi o Iraque, citado em 15.365 cables

> Os assuntos mais discutidos (segundo categorização própria) foram:
* Política Externa – 145,451
* Assuntos de política interna – 122,896
* Direitos Humanos – 55,211
* Condições Econômicas – 49,044
* Terroristas e Terrorismo – 28,801
* Conselho de Segurança da ONU – 6,532

Apesar da diversidade e amplitude dos dados publicados impossibilitarem tratarmos de todos os artigos e novidades que apareceram, vale a pena citar a lista elaborada por Zachary Roth das dez principais revelações trazidas à tona:

1. Diversas nações do Oriente Médio estão muito mais preocupadas com o programa nuclear iraniano do que demonstraram publicamente.

2. O Embaixador americano em Seul disse que negociações poderiam levar a China a "patrocinar" a idéia de uma Coréia reunificada.

3. A administração Obama ofereceria bônus a países dispostos a receber os detentos de Guantánamo, ao longo de sua tentativa de fechar a base.

4. O vice-presidente afegão Ahmed Zia Massoud teria levado 52 milhões de dólares em espécie em sua visita para os Emirados Árabes Unidos no ano passado.

5. Os EUA estão numa tentativa de retirar urânio altamente enriquecido de um reator paquestanês desde 2007, por medo de que ocorra a construção indevida de uma arma nuclear ilegal.

6. A Secretária de Estado, Hillary Clinton, pediu a seus pares internacionais que reunissem informações sobre os líderes de seus países e de organizações como a ONU.

7. O Qatar é visto como o Estado menos ativo na luta contra o terrorismo em toda sua região.

8. Os Primeiro-Ministros Putin e Berlusconi mantém uma relação muito mais próxima do que se imaginava.

9. O Hezbollah continua a receber armamentos da Síria.

10. Muitos dos cables mostram opiniões nada diplomáticas e pessoais sobre os líderes internacionais.

O que podemos notar ao olhar para estes assuntos, é que de um modo geral os EUA tentam, também através de sua diplomacia, reunir o maior número possível de informações sobre todos os líderes, países e situações que possam ter algum influência em seus objetivos diretos ou que possam significar um risco no futuro.

Há diversas análises colocando os EUA como arrogantes, "traiçoeros" e até obscuros em sua Política Externa, pelo fato de não medirem esforços e não se basearem em ações éticas (sendo as duas práticas exemplificadas pela espionagem do Secretário Geral da ONU, Ban Ki Moon) para defender seus interesses.

Para finalizar, também vale a pena ver que a repercussão deste escândalo deixou os EUA numa saia-justa com diversos países, e que, embora a desconfiança seja inevitável por algum tempo, os EUA estão correndo para minimizar os danos causados pela divulgação da parte oculta de sua diplomacia.

Não há dúvida do alcance de um escândalo como este, e que a até então respeitada diplomacia americana sofreu um duro golpe.

Se importantes indagações como "qual é a parcela de informações que temos sobre os processos globais?", ou se "sabemos as reais motivações dos atores políticos?" são levantadas, temos ao menos uma certeza: nem sempre os países expõe o modo como praticam o "Pensar Global".

P.S.: Para os interessados, vale a pena dar uma olhada na lista dos "principais insultos a líderes mundiais".


Leo Henry

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